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Somos cada vez mais numerosos, menos diversos. Somos tantos, mas é como se fôramos poucos. Tantos estilos, tantas possibilidades e tão poucas escolhas são feitas. Desejamos muito, mas sempre as mesmas coisas.
A individualidade não é um lugar de sonho e desejo. Não sou eu e minha capacidade de querer e decidir. É um lugar ao qual eu somente posso chegar comigo mesmo. Mas repito, não sou eu. Isso é precisamente o que desejamos que exista porque não está lá fora, mas eu francamente não sei o que está lá fora, do que se trata. Sei que se nos impõe, que nos cerca e envolve, que nos faz esquecer onde estamos e onde está.
Procuramos algo. É perceptível. Parece-nos que basta achar, portanto. Não é, assim, o mundo que não nos basta, mas nós que não nos bastamos. Contudo, ao invés de nos abrirmos cada vez mais para a busca, fechamo-nos. Buscamos o próprio desejo que somente se satisfaz, satisfazendo-se sempre. Ele não cessa. E nisso nos deseja mais do que nós próprios a ele.
Busquemos, então, dentro de nós... Buscar o quê? Podemos efetivamente encontrar algo que não se procurava ou não se sabe o que é? Como diferenciar as características da paisagem do próprio local? Como saber se somos aquilo que vemos? E quem vê a nós que vemos, vê a mesma coisa? Por que se vê outra, serão quantos “eus” no mesmo local?
O “dentro de nós” não nos é acessível. Serão lembranças, medos que não poderíamos diferenciar se estão no passado ou fazem parte de nosso presente. A maior parte deles sequer conhecemos. Na maior parte do tempo estão presentes, influenciam e provocam nossas ações sem que nos demos conta disso. Nossa vida consciente, adulta é, em mais da metade dos nossos dias, ignorada e inconsciente para nós.
Falamos porque repetimos a fala dos outros. Não inventamos uma língua para nós próprios. Reagimos repetindo os signos que querem dizer aquilo que queremos dizer ou nos é necessário dizer. Nisso adaptamos as medidas dos sentimentos aos gestos cognoscíveis. O que não pode ser reconhecido, não será expresso, mas também não será sentido. Não sentimos o que não podemos conhecer, mas geralmente não conhecemos o que sentimos.
Não somos consciências, mas sim inconsciências ambulantes. Por isso é fácil que nos igualemos à medida mesmo em que desejamos nos diferenciar dos demais. Se os impulsos são semelhantes, mesmo a diferença deverá ser reconhecida como tal sob pena de não ser diferença. Hoje, não há nada mais previsível que a diferença.
Não podemos buscar o indivíduo na diferença e na consciência, assim como não podemos fazê-lo com a similitude e com a inconsciência. Onde devemos buscar?
Hegel afirmara que o problema da lógica era o início. Para Luhmann, não era esse o problema. Tudo inicia com o já estar iniciado. Se o problema não é o início, nem mesmo o fim o será. O problema é o presente e sua improbabilidade, sua presença, seu poder de surpresa, seu existir porque não existe, o fato de ser um tempo que tem tempo.
O que percebo hoje, entre meus doutos colegas e porque não dizer também no sujeito que vos fala, é um fenômeno satirizado pelo Slavoj Zizec - gostei do plano de fundo do blog retirado de "A visão em paralaxe" - referente à negação consciente da alteridade. Em "Como ler Lacan", Zizec diz que uma piada muito contada no círculo lacaniano refere-se a um homem que acredita ser um grão de semente e por isso é levado para um hospital psiquiátrico. Uma vez curado, convencido pelos médicos de que é um homem e não um grão de semente,
ResponderExcluirlhe permitem sair do hospital mas esse logo volta tremendo. "Meu caro rapaz, você sabe que não é um grão de semente, mas um homem." diz o médico. "Claro que eu sei disso, mas a galinha sabe?". Esta esdrúxula anedota refere-se a latência inconsciente de nosso convencimento. Todos nós entendemos os perigos do individualismo, da coisificação do homem, do materialismo consumista e no entanto a "crítica" não passa de nossos dircursos. Na prática continuamos a buscar símbolos que nos protejam de nossas inseguranças e carências. Um carro, uma roupa,um(a) companheiro(a) ou até mesmo um curso superior de status quo ostensivo. A verdadeira "Teoria
do Medalhão" de Machado de Assis. Lembrando Márcia Tiburi; "Em sociedade onde a libido fora industrializada, só estamos nus quando vestidos." Em um meio onde a lei máxima recompensa quem melhor consegue aparentar o que não é ou pensa ser, vivemos uma ininterrupta competição estéril e alienante que nos faz dançar entre pessoas cujas fantasias sejam as mais belas sem nunca nos permitirmos olhar além da máscara e da etiqueta.
Acredito que o fatídico pensimismo existencialista de Sartre aplica-se atualmente com perfeição, na contemporaneidade "L'enfer c'est les autres."
Antes de me despedir, gostaria de lhe convidar para ler meu último post "Carta à resistência", em que abordo tema afim.
Aguardo sua interpretação e comentário.
Bráulio M. Rodrigues
http://opoetaeaputa.wordpress.com/